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sábado, 30 de outubro de 2010

A FAMÍLIA COMERCIAL DE MARGARINA! UMA FAMÍLIA PERFEITA QUE NÃO DERRETE NUNCA.

Desde que eu me entendo por gente, propaganda de margarina é tudo igual. Há sempre uma família estupidamente feliz, mesa farta e, claro, um pote de margarina. Daí toda a família troca olhares de júbilo enquanto desliza uma espátula “cheínha” de margarina num pão bem quentinho. E mais, fazem cara de esfomeados felizes, mordem a fatia do pão (Nhac!!) e finalmente proferem um melodioso: "Hummmmmm, delícia!". Assim começa o dia para uma família de comercial de margarina, ou melhor, a família perfeita que não derrete nunca.
E há mais de 50 anos que as propagandas e os comerciais de margarina encantam, assustam, deprimem, seduzem, cativam e povoam o imaginário das famílias ditas “normais”. E o mais interessante é que o panorama familiar apresentado nos comerciais nunca muda. É sempre o mesmo: Um lindo dia de sol adentrando na janela de uma linda casa, com cortinas brancas esvoaçantes, pássaros em silvo e flores campestres que avivam o lindo cenário. E a mesa do café da manhã? Lóóógico que é surreal, maravilhosa e superabundante: frutas, leite, ovos, sucos, chás, pães, queijos, frios, torradas, croissants, papas, mingaus, geléias, yogurtes, cereais, patês, biscoitinhos, bolos... e ela, a margarina. Quanto à família, nem se fala. Todos e todas acordam satisfeitos às 5h45m já maravilhados com o sol e definitivamente felizes. A esposa linda, super tranqüila, magra, branca, bem vestida, cabelos escovados e no alto de um salto 12 serve o café. O maridão também lindo, elegante, branco, cheiroso, alto, bem humorado e com a barba bem feita, dá um sonoro: Boooooooooom dia! (lindo, né não?). Geeeente! E as crianças? Todas impecáveis, lindas, brancas, meigas, amáveis, carinhosas, engomadinhas, alegres, saudáveis e... Comportadíssimas! Sem falar no “Rex”, o cão, latindo e correndo pela casa. Também lindo, brincalhão, sem pulgas e de banho tomado. Enfim, este é o panorama familiar que está registrado no inconsciente coletivo de muita gente ao longo de todos esses anos.
Caríssimos/as é muito “raro” encontrar famílias iguais as dos comerciais de margarina. Uma vez que o nosso dia a dia é bem mais árduo do que os mostrados aqui, nas propagandas. Esses comerciais mostram um modelo “idealizado” de família totalmente fora da realidade, pelo menos para alguns milhões de brasileiros... Não que ninguém possa ambicionar algum dia ser um casal estável, com filhos tranqüilos e ausência de atritos. Até porque todos nós criamos expectativas e fantasias, né não? Mas o que eu quero dizer é que pelo menos se crie um modelo compatível com a realidade do cotidiano familiar brasileiro. Pois eu, definitivamente, não acredito em nenhuma propaganda de margarina (... e nem de inseticida!). Tu achas que algum dia eu vou acreditar que a margarina “tal” seja capaz de tornar famílias e pessoas mais unidas e felizes? Agora! Se você acredita e gosta do que vê nos comerciais de margarina, então compre. Eu sinto-me feliz em não mais ser iludido.
Ei... Peraí! Não pensem que sou o inimigo numero um das margarinas. Claro que não! Nada tenho contra as margarinas, cremes vejetais, halvarinas, margarelas e seus derivados. Pelo contrário, EU ADORO UMA MARGARINA NUM PÃO BEM QUENTINHO... Só não gosto das campanhas publicitárias. Elas tentam colocar na cabeça das pessoas que nada dá errado em nossas vidas, que nada nos falta, que temos abundância em tudo. Como se a nossa casa estivesse sempre perfeitinha; nossa bondade, saúde e bem estar em dia; nossa vida profissional magnífica e que entre nós tudo são rosas brancas. Isso é o que eu não gosto e nem acredito! Mas a verdade é essa... Nos comerciais de margarina todas as famílias são escancaradamente felizes,  mas só “publicamente” meu bem.  E isso nos faz pensar que a família do vizinho é sempre mais harmoniosa que a nossa, que nossos filhos são uns “pestinhas” e que o marido alto, loiro e lindo da fulana da esquina é tudo que há... Sim! O marido da outra é perfeito porque não vive com você meu bem! Toda família – na intimidade – tem ajustes a fazer. Essa “perfeição” ofertada nos comerciais de margarina para mim é “fake”, compra e acredita quem quer... A família “perfeita”, no meu entender, é aquela que sabe enfrentar os momentos críticos e difíceis. Porque a vida em família é também um amontoado de problemas que normalmente gera frustrações. E viva a família feijão com arroz!!! kkkkkkkkk

Eu conheço gente que “deprime” toda vez que assiste um comercial de margarina... Juro! É verdade. Já se imaginaram comprando um pote da margarina “tal”, e junto com ele, o desejo de ter a uma linda família igual aos comerciais de margarina? Pois é, tem gente que ainda acredita. E quando se depara com a realidade cotidiana de uma família normal... Hummm! Deprime geral. Não ter “uma família margarina feliz” pode ser um sinal de que algo de muito errado existe (uiiiiii?!). E a culpa pode ser sua. Cuidado!!! Vai que você anda comendo a margarina errada e não sabe? Ah, se um simples potinho de margarina fosse à solução para os conflitos familiares existentes no Brasil e no mundo...!
E mais, nunca precisei dançar “O último tango em Paris” para saber que a margarina serve para mil outras coisas... Mas nos comercias do produto ela parece servir apenas e tão somente para passar no pão ou na torrada. Margarina só combina com pão é? E é!!! Deve ser por isso que a margarina só é “a estrela” no café da manhã... E até porque ninguém vai passar o restante do dia comendo pão com margarina. Ou vai?!
Sinceramente! Eu não acredito que seja possível levar uma vida de comercial de margarina o tempo todo... Me poupem né! Mas eu acredito que podemos – de vez em quando – nos proporcionar MOMENTOS COMERCIAL DE MARGARINA... Por que não? O que é que custa, uma vez perdida, botar a mesa para o café da manhã e juntar a família? Mesmo que nesta mesa só tenha café puro, pão, ovo, cream-cracker e margarina. O “toque glamourizado” quem dá é você meu bem! Não custa nada sermos felizes com aquilo que temos no momento e na companhia daqueles a quem amamos... E só.

Não seria fantástico um comercial de margarina mostrando uma família pautada na realidade... Onde de repente os pais - separados ou não - juntamente com os filhos, o cachorro e o papagaio acordassem apressados, em cima da hora, e com tudo por fazer? E, rapidamente, tivessem que dar conta de tudo. Organizar o material escolar enquanto as crianças tomam café. Daí as crianças derrubariam o achocolatado na toalha da mesa, o cachorro latia, o irmão mais velho “arengava” com a irmã menor, o pai intervia e ao mesmo tempo passava o olho nas contas à pagar pregadas na porta da geladeira. A mãe “ligadona” gritava lá do banheiro: Para com isso menino... Quem já viu passar margarina na cabeça da sua irmã? Já para o banheiroooooooo! (rs)... Então é isso caríssimos/as. A felicidade familiar nem sempre depende da ausência de estresse, confusão e mesa farta, como pregam os comerciais de margarina. Podemos ser felizes sim!!! Driblando tudo isso com sabedoria e muito humor, né não? Agora vamos falar das margarinas que marcaram época..

Geeente! Esta margarina marcou minha infância... Quem não se lembra de ter visto na televisão - durante a década de 70 - o comercial da margarina bem-te-vi? O comercial mostrava um menino e uma menina (com um laço enooooooorme na cabeça) numa charrete, enumerando os itens da compra que estavam prestes a fazer. “Sal, café, fubá, açúcar, margarina... Que margarina? Bem-te-vi!”. Daí um assovio imitava o passarinho e a imagem do bem-te-vi saía voando atrás da charrete... Bem-te-vi, bem-te-vi.” O filme era preto e branco e tinha a marca do artista plástico pernambucano Lula Cardoso Ayres. Que saudades meu Deus!
Nunca experimentei esta margarina, mas sempre a vi estampada nas páginas das revistas  “Seleções” do meu avô Albino.  Na verdade, o nome nem era margarina ainda, se chamava “Gordura Vegetal Hidrogenada Saúde”. Ela surgiu no final da década de 40 para desbancar a “banha de porco”, gordura barata e tida como não saudável. E também porque a manteiga, na época, era muito cara.
Anúncio anos 60.
Anúncio anos 70.
A margarina Delícia foi lançada em 1959 e até hoje se encontra presente na mesa dos brasileiros. É uma das marcas mais lembradas por todos nós.
Anúncio anos 70.
Anúncio anos 70.
Eu lembro dessa margarina até hoje... Era a preferida da minha Avó Maria. Ela surgiu bem antes do filme “Dona Flôr e seus dois Maridos” (1976) com Sonia Braga e José Wilker. Mas atingiu o ápice, indiscutivelmente, com a popularidade do  filme de Bruno Barreto. E todo mundo passou a chamar de: A margarina de Dona Flor e seus dois maridos. Inclusive minha avó Maria.

A margarina becel, feita com óleos de sementes de girassol, foi lançada no Brasil em 1975. E é conhecida até hoje como a margarina que cuida do seu coração. A embalagem antiga era mais bonitinha, né não?
A margarina Claybom chegou ao Brasil na década de 50 em latas redondas. E ainda nesta mesma década, tornou-se a primeira margarina do Brasil em tabletes, embaladas em película de alumínio.
Na década de 70 a margarina Claybom ganhou uma mascote nada convencional. Foi a Menininha gulosa “Nhac”, que acabou virando um ícone da marca. Ela aparecia em todos os anúncios da margarina Claybom, na TV e em revistas.

A margarina Doriana surgiu pela primeira vez no mercado brasileiro em 1970. E ficou conhecida como a primeira margarina cremosa do país. Seu slogan mais famoso foi: “por um café da manhã mais feliz”.
Anúncio anos 80.
Anúncio anos 80.

Literalmente, as margarinas deixam marcas em nossas vidas. Seja no tocante ao sabor, quanto nos patéticos e emocionantes comerciais e propagandas... Quem não lembra da Mila ( a margarina que veio do milho ), Cyclus ( a vida é feita de Cyclus), All Day (Oh! Happy Day...) Bonna ( é bom estar assim, feliz à toa...), Alpina (passa Alpina que passa... Tendo Gerson Brenner como garoto propaganda), Soft&Line, Qualy (com aquele pato magrelo da sadia pulando), Deline, Delicata, Amélia, Bambina, Primor, Soya, Vigor, Cremosy Petybom, Margarella, Paladar, Puro Sabor, Leco, Mesa, Adorella, Línea, Fiorella... E a FAMÍLIA DAS MARGARINAS cada dia aumenta mais. Isto, é real! He,he,he.

domingo, 10 de outubro de 2010

A "ESTANTE DE TIJOLOS" E A MINHA FUGAZ INTELECTUALIDADE DE ESQUERDA !

Fui uma criança totalmente alienada politicamente. Pudera! Eu sequer entendia o clima nebuloso, repressivo e ameaçador da década de 70... Tempos de Ditadura Militar meu bem. O cenário era verde oliva e as atitudes eram “a la Garrastazu Médici”. Aquela coisa... Direita volver e esquerda jamais!!! O preto coturno do exército brasileiro dominava o pedaço. E eu - demente - colecionava as figurinhas do Álbum “Brasil, Ordem e Progresso” e ainda “morria” de cantar na escola: EU TE AMO MEU BRASIL! Enfim, eu, como tantos outros, fui um garoto desorientado no tocante ao militarismo ditatorial e seus atos execráveis. E quando vim entender melhor “as coisas” já era tarde demais... A Ditadura estava com os dias contados. E junto com ela, o meu sonho de um dia vir a ser um militante do partido dos camaradas vermelhos. Sim! Mas o que é que tem a ver a “Estante de Tijolos” (modismo “desbundado” na década de 70) com a Ditadura Militar (1964/1985)...


Tem tudo a ver. É que antes de completar 14 anos eu já tinha decidido que seria um “intelectual” de esquerda. Pode? Então coloquei na cabeça que tinha que ser complicado, esquisito, subversivo, hippie e o escambau... Lia tuuuuuuuuuuudo. Desde A ILHA de Fernando Morais, passando por FELIZ ANO VELHO do Rubem Fonseca e GOTA D’AGUA do Chico Buarque e Paulo Pontes. E todos esses livros (com crivos da censura) saíram da “Estante de Tijolos” da amiga de minha tia Dagmar, chamada Conceição Fonseca (Ceça). Advogada e militante radical do Partido Comunista. Meu sonho de adolescente na época era ter um kitnet igual ao dela. Chamava-me a atenção os tapetes de sisal espalhados pela sala; as várias almofadas estilo indianas de tudo quanto era tamanho; as samambaias na janela e um pôster do CHE junto com o de MARIGUELLA. E em seu quarto - reinava absoluta - a famosa “Estante de Tijolos” recheada de livros subversivamente maravilhosos. A estante era feita da seguinte forma: Três tábuas bem compridas (retangulares) pintadas de branco e doze tijolos com furinhos no meio. Primeiro colocava-se os tijolos no chão (de forma que ficassem espaçados uns dos outros) e depois era só colocar as tábuas por cima. E de forma alternada a “Estante de Tijolos” ia tomando corpo...


Lembro que todas às vezes quando ia visitá-la, juntamente com a minha tia, ela me dizia: “companheirinho, vai lá à estante que tem coisa nova por lá”. Era como receber um passaporte pra felicidade. Eu deitava no chão e ficava ali, horas e horas... Tinha alguns livros que ela não me deixava mexer. Dizia que ainda não era o momento, como por exemplo, O LIVRO VERMELHO do Mao Tsé Tung e os livros de Adelaide Carraro e Cassandra Rios... (esses eu li escondido dela). Foi na casa dela que conheci o escritor Roberto Freire (ele autografou meu livro Coiote nesse dia). A minha relação com a “Estante de Tijolos” da companheira Ceça era tão íntima, que ali mesmo eu chorava, ria, me revoltava e falava mal do capitalismo pequeno burguês. Pois é, nasci em plena Ditadura e passei minha adolescência no auge da luta pela Anistia Ampla Geral e Irrestrita. Sonhava com um governo popular das massas, desejo de libertação proletária... Enfim! Hoje o sonho acabou. E me entristece ver tantos intelectuais de esquerda na pós-Ditadura, abraçando os frutos de uma sociedade capitalista como a nossa. Ainda bem que a minha companheira Ceça e sua “Estante de Tijolos” já não estão mais por cá. “E viva eu, viva tu e viva o rabo do tatu”.